8.10.03

Todos se despediram dele. Amigos, familiares, passantes. O grupo estava bem perto do portão de embarque e a cena quase comoveu um dos seguranças. Muitos abraços, beijos, tapinhas nas costas, alguns tapas "delicados" no rosto e muitas, muitas lágrimas. Acenou uma última vez e decidiu que não iaria olhar para trás.
Girou sobre os calcanhares, ajeitou o mochilão nas costas e se foi. Sumiu logo após ter passado pelo detetor de metais e dirigindo-se ao portão de embarque lembrou-se de que tinha um certo temor de aviões.
- Quero ver como é que vai ser no dia em que as leis da física forem revogadas... - pensou distraidamente.
A aeromoça falava mas sua voz parecia vir de muito longe. Agradeceu a atenção dela e parou na pista olhando fixamente para o aparelho enquanto se imaginava frente à esfinge pronta para devorá-lo caso não a decifrasse. Tentou sorrir mas o máximo que conseguiu foi um esgar sofrido. Quase abandonou tudo e voltou mas conseguiu controlar o impulso e começou a subir as escadas que o levariam ao interior do avião.
Tudo parecia em câmara lenta. Inclusive as vozes das aeromoças que o recebiam à porta do aparelho. Procurou por seu lugar mas o corredor parecia se alongar mais e mais fazendo com que seu assento ficasse cada vez mais longe. Fingiu indiferença e seguiu pelo elástico corredor. Guardou o mochilão no compartimento e sentou-se pesadamente na poltrona. Levantou-se mais uma vez e, olhandou ao redor, identificou as saídas de emergência. Voltou a sentar-se.
Olhava fixamente para um ponto distante dentro de si.
- Lskfjshdflkkkjefhhhodifh?
- Perdão. O que disse?
- O senhor gostaria de uma bebida antes da decolagem?
- Vodka com gelo e um twist!
- Não temos limão, senhor
- Sem twist então!
A aeromoça esticou o braço para entregar-lhe o copo e ele reparou como as mãos dela eram bonitas e bem cuidadas. Sorriu e agradeceu.
Bebeu tudo em duas goladas e percebeu que tudo voltava a ficar em foco. Infelizmente isso não fez com que a poltrona ficasse mais confortável. Deslisou a bunda até quase o fim do assento mas de pouco adiantou e resolveu parar de lutar contra ele pois certamente perderia a briga. Pediu mais uma vodka e dois goles depois, a poltrona começou a ficar razoavelmente confortável.
A voz do capitão pelo alto-falante avisa que "vamos começar a taxiar a pista". Lembrou-se do quanto sofria nas deolagens e economizou vodka.
Relaxou um pouco após a traumática deolagem e não conseguiu deixar de pensar que todos os capitães dos vôos que tomou gostavam de fazer o avião sacudir bastante só para sacanear.
- Você parece nervoso! - A voz era grave porém, indubitavelmente, feminina.
- É tão óbvio assim?
- Bastante! Esperei a té decolarmos para falar com você. Achei que você ia precisar de uma conversinha.
A mulher, já perto dos quarenta, não era exatamente bonita mas seu rosto era assimetricamente atraente. Tinha a pele queimada pelo sol e uma vasta cabeleira vermelha emoldurava o rosto fino de lábios iguamlente finos que escondiam dentes bem alinhados e muito brancos. Vestia uma calça jeans já bem surradas e uma jaqueta de couro marrom com uma camiseta branca por baixo.
- E eu achando que era um sujeito discreto. Quer um drink?
- Me dá um gole do seu?
- Mas aí você vai descobrir meus segredos. Bom... na verdade eles nem são importantes. - terminou a frase e entregou o copo. Ela bebeu pequenos goles e devolveu o copo com uma mancha vermelha de baton. Ele pegou o copo e achou que o copo plástico com a mancha de baton e a vodka tinham ficado muito bonitos.
- Desculpe. Manchei seu copo.
- Sem problema. Ficou até mais bonito o drink! - ela sorriu e perguntou:
- É a primeira vez que você sai do país?
- Não. Ja tinha saido antes mas acho que dessa vez não volto.
- Hmmm... Vai encontrar alguém?
- Vou.
- Quem?
- ... Eu.

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