27.8.03

Vc já pegou o metrô até a pavuna? Reparou que a linha acaba alí? Que é diferente da Saens pena e de Copacabana, que a estação acaba, mas a linha continua pra dentro daquele buraco escuro, que leva o trem para algum lugar... Pois é... na Saens Pena e em Copa, é o fim da linha, mas existe uma promessa de continuar... Às vezes eu me sinto na estação da Pavuna.

Noutras, me sinto em Copa ou na Saens Pena; prestes a entrar no buraco escuro...

Pois é... Pra esses lugares existem projetos pro futuro... Já existe até a estação nova da S. Campos, esperando somente o trem ir pra lá... Mas na Pavuna, no final da estação, só tem um saco de areia no trilho. A linha acaba ali. Não tem mais pra onde ir, a não ser voltar...

Por enquanto.

Porque podem surgir projetos novos; retirarem os sacos de areia dali e estenderem até campo grande...

E dali, até mais longe; como os trens. E fazerem outras linhas, outras baldeações... Não será mais preciso voltar.

Ninguém se importa com a baixada... A baixada é pobre, triste e desolada... Como por vezes somos por dentro...

Não volte. Tire os sacos de areia e construa novos trilhos. mesmo que seja para a baixada ou Duque de Caxias... É o seu caminho e ninguém tem o direito de dizer que ele é feio.

Não é o caminho que eu queria...

Então entre no escuro de Copa ou da Saens pena. E vá atrás do que vc quer.

Sempre.

25.8.03

Era sábado de manhã e ela não tinha acordado ainda. Dormia numa paz tocante com a boca entreaberta e reparou como ela ficava bonitinha dormindo assim. Pensou também que pouquíssimos adultos pareciam bonitos dormindo com a boca entreaberta mas ela ficava quase angelical.
Levantou-se, passou por cima dela que resmungou alguma coisa com os saculejos da cama e, já de pé, deu uma outra olhada na paz que rosto trasmitia e deu-lhe um beijo na testa. Reparou que hoje, o despertador não parecia rir dele como faz durante a semana. Inclusive o observava com um certo ar de tristeza por não poder acordá-lo. Sorriu e pensou:
- Hoje não!
Foi até a cozinha preparar um café e fumava uma cigarro enquanto vigiava a chaleira. Lembrou-se de sua mãe:
- Bule vigiado não ferve! - Sorriu e teve que segurar uma vontade insana de gargalhar. Lembrou que sentia uma saudade imensa dessa frases que sua mãe costumava dizer.
- Meu filho, a situação está negra como as asas da graúna! - Essa era uma das preferidas dos dois.
Preparou o café forte como fazia sempre e foi se sentar na sala. Olhou para o piano que ficava com a cauda virada para uma janela enorme e retangular de onde se via boa parte da praia. O dia lhe pareceia bonito apesar da ameaça de chuva e dos relâmpagos que se avistava no horizonte. Sentou-se ao piano e começou a dedilhar "Volare, Volare!" com a mão direita enquanto a esquerda se dividia nas tarefas de segurar a caneca e o cigarro entre os dedos. Começou a achar que poderia causar um acidente com o excesso de funções desempenhadas pela nem tão precisa mão esquerda. Apoiou o cigarro em um cinzeiro e a caneca sobre o piano e agora, com as mãos livres, tocava com um pouco mais de concentração e menos displicência porém ainda tinha o olhar pregado no movimento das ondas. Parou de tocar, bebeu um gole de café e deu um trago no cigarro. Continuava olhando parar a praia e para os relâmpagos ao fundo como se os anjos tirassem fotos do seu recital improvisado ao piano.
- Já que estão tirando fotos vou tocar uma coisinha mais legal.
Começou "Clair de Lune" e se sentiu um daqueles pianistas exêntricos. Riu e se permitiu concentrar profundamente no que estava tocando.
Fez uma pausa dramática na execução brilhante, olhou para a janela mais uma vez e viu que um raio de sol passeava entre as nuvens chegando a té a superfície do mar e deixava um rastro dourado. O mesmo raio de sol atingiu seu rosto fazendo com que fechasse os olhos. Ao fazê-lo, teve a impressçao de que a música o invadia. Tocava cada vez mais emocionadamente e o mundo ao seu redor pareceu se dissolver. Só existiam ele, o piano, a praia e o raio de sol.
Ao acabar a música, ainda de olhos fechados descansou as mãos sobre as teclas e respirou fundo. Levou um pequeno susto ao sentir que as mãos dela tocaram seus ombros e foram descendo por seu peito até seus braços se enroscarem em seu torso. Ganhou um beijo no rosto e escutou a voz sonolenta (ele achava extremamente sexy a voz dela assim que acordava) dela dizer que nunca tinha escutado tanta devoção numa música tão conhecida e simples.
Ele se virou de lado no banquinho e ela se sentou no seu colo.
Ao longo de toda a manhã os dois permaneceram assim abraçados e olhando para o único raio de sol que ainda brincava sobre as ondas.

Arquivo do blog

Free counter and web stats